A saudade tem destas coisas: queima quando é reservada no peito como vinho enriquecido pelas pipas do tempo. Arde como chama que flameja ao vento da eternidade enquanto grita o silêncio calado no despertar da emoção.

 

Há saudade que bate ao ritmo do pulsar do coração.

 

Lembranças que não se apagam, memórias que constituem os alicerces de uma vida inteira. A resposta verdadeira daquilo que fomos, tudo o que somos e onde queremos chegar. Quem deixámos, o que abandonámos e o próximo passo a dar. Seguir em frente. Dia após dia, mês após mês. Um desafio levado de cada vez.

 

Neste período lembramos com maior intensidade aqueles que já partiram, aqueles que fugiram da vida ou a quem a vida lhes fugiu. Hoje brindo à memória dos Homens que fizeram a história, que trouxeram a glória aos nossos dias, que queimaram as mãos com o fogo da guerra, no mato da serra e ainda assim nos deram de beber. Que nos mataram a sede, a fome e o frio. Que deixaram o vazio quando partiram. Que nos explicaram com a ausência o verdadeiro significado da saudade. Eles a colheita eleita para a melhor das reservas. Detentores da cor perfeita, aroma ideal, textura e corpo. Eles que por vezes habitam o nosso olhar absorto que se perde no horizonte. Eles que nos deixaram com a saudade instalada no peito. Saudade que nunca se apaga nem se resolve, que se confunde com a mágoa de quem deixou passar a oportunidade. De quem se perdeu na dura realidade de uma sociedade que nos ocupa em demasiado. Saudade que é saudade por termos andado a olhar para o lado errado. Rolhas estragadas em garrafas de vinho bom, cortiça podre que nem o som consegue isolar.

 

Saudade que sabe matar.

 

Lágrimas que correm nas paredes de um copo meio bebido, o desejo de afogar as tristeza da ausência. Olhos fixos e abertos que não veem nada, cegos pela dor. E andamos às voltas, perdidos nos horários de chegar e partir, nos compromissos que nos fazem sentir perfeitos inúteis. Fúteis e sorumbáticos. Erráticos na forma de viver porque temo dizer que sejamos gente que anda a perder o melhor que a vida tem: aqueles que amamos.

 

E para mim não há enganos;

nesta hora de memória e honestidade

invoco os ideais mais profanos

para erguer a minha taça e brindar à saudade.

 

Saúde.

 

#tristaodeandrade