“Agora que aprendi que o tempo sabe voar vou tentar agarrar cada segundo que me resta porque o tempo nunca se dá para sempre, só se empresta. Vou celebrar a vida como se o dia-a-dia fosse uma permanente festa. Brindarei com vinho e poesia, lucidez e fantasia. Este é o segredo para de forma honesta combater o medo de ver tudo a acabar. Venha de lá mais um copo de vinho porque talvez o vinho me consiga sossegar”.

 

Durante muitos anos ouvi dizer que foi desta forma que Rodrigo Pires Cavaleiro de Castro se revelou no Teatro Maria Cunha. Era uma noite de espetáculo, a peça “Joana de Marselha” estava em cena e a plateia repleta. Rodrigo, um ator mediado a viver uma vida de miséria, procurava o reconhecimento no mundo das artes. Não era fácil e mais difícil seria pelo simples facto do próprio rapaz não saber bem o que era. Enfim, o que era? Era um problema de definição, de determinação naquilo que procurava fazer. Sentia nas profundezas do seu coração que trazia uma mensagem de outra vida. Sentia. Mas como fazer para comunicar?

O exercito precisava de braços jovens e fortes, não de mentes pensadoras e armadas ao sentimentalismo.

 

Aquelas noites de teatro eram inesquecíveis. Homens cultos de lá para cá, vultos da sociedade acompanhados de senhoras que já mostravam o que estaria para chegar: a emancipação.

 

Ali vivia-se um turbilhão de acontecimentos motivados por forças nervosas e prontas para atacar.

 

“Fora com eles. Viva Portugal” – gritou uma voz no meio da sala.

 

Naquele instante, após a ousadia e o distúrbio, nada mais se escutou senão o silêncio. Ninguém ousou mexer uma palha para identificar o dono do grito.

 

Parecia ser a noite em que tudo estava para acontecer. Primeiro o jovem Rodrigo, rapaz de famílias do Eça, a declarar amor à vida e ao vinho, e depois um qualquer tresloucado com gritos patrióticos.

 

O bom comportamento dos presentes, a qualidade dos convidados e a vergonha escondiam o medo da aprovação e no entanto todos queriam um Portugal livre.

 

Numa das paredes era visível um anúncio comercial pintado no próprio estuque.

 

“Real Companhia Velha”

 

Na guerra e na paz, nas ofensivas ou na resistência, o vinho está sempre presente e a correr das vinhas para as gargantas dos nobres soldados. E estes eram tempos de guerra. De invasões. De desafio. De defender o ouro que se bronzeava nos socalcos das margens do Douro, expulsar Napoleão e construir alianças de espadas. Dias em que o Lorde Wellington estacionava o seu exército em Lamego e encomendava vinho. Muito vinho.

 

Nunca se conseguiu saber quem gritou naquela noite, no entanto o discurso de abertura do candidato a ator ficou para sempre a entoar pelos campos de Portugal. Para fazer lembrar que o tempo passa sem obedecer à vontade humana e que arrasa quem não reclama o direito à vida. Seja em período de guerra ou paz, ano de boa ou má colheita, aquilo que não se aceita é desperdiçar a oportunidade.

 

Talvez esta seja a explicação para que o tempo pare no preciso instante em que estou a beber um copo de vinho.

 

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